Table Of ContentColeção Clássicos Globo
Coordenação: Manuel da Costa Pinto
Títulos publicados: Memórias de um sargento de milícias, de Manuel Antônio de
Almeida Macário/Noite na taverna, de Álvares de Azevedo A Viagem à Lua, de
Cyrano de Bergerac As aventuras do sr. Pickwick, de Charles Dickens O
bracelete de granadas, de Aleksandr Ivánovitch Kuprin Ecce Homo, de Eusébio
de Matos Pequenas tragédias, de Aleksander Sergheievitch Púchkin A capital!,
de Eça de Queirós Infortúnios trágicos da constante Florinda, de Gaspar Pires de
Rebelo
A cartuxa de Parma, de Stendhal O Silvano, de Anton Tchékhov
Contos e novelas, de Voltaire
A coleção Clássicos Globo traz obras célebres da literatura universal e da língua
portuguesa, retomando e ampliando um dos projetos editoriais mais marcantes
da história recente do Brasil: o acervo de traduções constituído nos anos 1930 e
40 pela editora Globo de Porto Alegre, que tinha, entre seus colaboradores,
intelectuais como Erico Verissimo e Mario Quintana, e ficou conhecida como
“Globo da rua da Praia”.
Os títulos da coleção Clássicos Globo foram escolhidos a partir desse catálogo.
Além das traduções (revistas e atualizadas) de livros pertencentes ao cânone da
literatura ocidental, a coleção compreende também novas obras, em edições
críticas e versões feitas por tradutores contemporâneos que dão continuidade a
esse legado editorial.
Cyrano de Bergerac
V L
IAGEM À UA
tradução:
Fulvia M.L.Moretto
posfácio:
Jacyntho Lins Brandão
Copyright © 2007 by Editora Globo S. A.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta edição pode ser utilizada ou reproduzida – em qualquer
meio ou forma, seja mecânico ou eletrônico, fotocópia, gravação etc. – nem apropriada ou estocada em
sistema de bancos de dados, sem a expressa autorização da editora.
Título original:
Voyage dans la Lune
Revisão: Beatriz de Freitas Moreira, Maria Sylvia Corrêa, Carmen T. S. Costa e Valquíria Della Pozza
Capa: Isabel Carballo, sobre “Cyrano de Bergerac é levado por pássaros ao espaço”, ilustração para
Viagem à Lua (1657-1662).
CIP-Brasil. Catalogação-na-Fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
B436v
Cyrano de Bergerac, 1619-1655
Viagem à Lua / Cyrano de Bergerac ; tradução Fulvia M. L. Moretto ; posfácio Jacyntho Lins Brandão. –
São Paulo : Globo, 2007.
(Clássicos Globo)
Tradução de: Voyage dans la Lune
ISBN: 978-85-250-5573-6
1. Ficção francesa. I. Moretto, Fulvia. II. Título. III. Série.
07-1590. CDD: 843
CDU: 821.133.1-3
25.04.07 11.05.07 001672
Direitos de edição em língua portuguesa adquiridos por Editora Globo S. A.
Av. Jaguaré, 1485 – 05346-902 – São Paulo, SP www.globolivros.com.br
Sumário
Capa
Coleção Clássicos Globo
A coleção
Folha de rosto
Créditos
Nota Introdutória
Viagem à Lua
O outro mundo ou os Estados e Impérios da Lua
Cartas diversas
O inverno
O verão
A primavera
O outono
Contra La Mothe, ladrão de pensamentos
Contra Chapelle, ladrão de pensamentos
Contra o gordo Montfleury, mau autor e comediante
Apoteose de um eclesiástico bufão
Contra um jes... assassino e maledicente
Descrição do aqueduto, ou a fonte de Arcueil, aos meus amigos bebedores de
água
Sátira contra Soucidas (Dassoucy)
Descrição de uma tempestade
Dos milagres das ribeiras
O poltrão
O duelista
Ao professor de retórica dos jes...
Descrição de um cipreste
Sobre um enigma que o autor enviava ao senhor de ***
Enigma sobre o sono
A favor dos feiticeiros
Contra os feiticeiros
Posfácio
A Lua de Luciano
A Lua de Cyrano
Cronologia
Notas
Nota Introdutória A sobre este
QUILO QUE SE DEVE SABER
livro está, obviamente, no próprio relato de Viagem à Lua
(O outro mundo ou os Estados e Impérios da Lua) e, não
menos, no ensaio de Jacyntho Lins Brandão publicado
como posfácio da presente edição. No erudito texto do
autor de A invenção do romance, temos uma leitura no
sentido forte do termo: expõem-se aí as obras e os autores
que estabeleceram uma tradição das narrativas em torno
do tema da viagem à lua, desde o Luciano de Samósata
de Icaromenipo e das Narrativas verdadeiras até
contemporâneos de Cyrano como o célebre astrônomo
Johann Kepler, autor de uma peça literária intitulada
Sonho ou astronomia da Lua (1634), e o bem menos
célebre prelado anglicano inglês Francis Godwin de O
homem na Lua (1638), passando por um clássico da
literatura italiana como Orlando furioso (1516), de
Ariosto.
Chega-se então a Edgar Alan Poe (As aventuras sem par de um certo Hans
Pfall), Júlio Verne (Da Terra à Lua) e H. G. Wells (Os primeiros homens na
Lua), mas também ao nosso Machado de Assis, que nos seus elogios a Luciano,
Swift e Voltaire bem poderia ter reservado umas palavras ao Cyrano — que
afinal celebrizou modernamente o topos da prospecção lunar como viagem
especular, na qual “a Lua é um mundo como este, ao qual o nosso serve de lua”.
Uma outra forma de abordar a Viagem à Lua, porém, consiste em tomar
aquilo que já sabemos sobre seu autor, para apontar a diferença que se interpõe
entre o Cyrano de Bergerac “histórico” e aquele que entrou em nosso imaginário
por obra e graça de Edmond de Rostand. Pois o fato é que nós — leitores pouco
habituados às convenções da literatura antiga, medieval e renascentista, cujos
resquícios persistem no século XVII — acabamos conhecendo o espadachim e
poeta seiscentista pela pena do comediógrafo oitocentista do Cyrano de
Bergerac.
A peça, cuja estréia se deu em Paris no ano de 1897, é um caso raro de
desrespeito respeitoso: recheada de anacronismos, infidelidades históricas e
literárias, trata-se não obstante de um clássico do teatro de boulevard, no qual a
figura do Cyrano de Bergerac surge envolta numa aura romântica e propicia uma
conversão amorosa. A história é conhecida: apaixonado por sua prima Roxane, o
feio e narigudo Cyrano descobre que ela está enamorada por um jovem soldado
chamado Christian; Cyrano ajuda o belo e inculto pretendente a conquistar
Roxane por meio de cartas encantadoras e versos que Christian declama para a
amada sob o balcão de sua casa, mas que são ditados pelo poeta, oculto na
escuridão noturna. Percebendo que Roxane só se apaixonara por conta desse
artifício, Christian exige que Cyrano conte a verdade, mas morre ferido por uma
bala, deixando a Roxane — que se retira da vida mundana num convento — uma
carta, também escrita pelo amigo. Muito tempo depois, quando um Cyrano
moribundo relê para ela essa última missiva de Christian, Roxane descobre o
verdadeiro poeta criador das palavras que a cativaram, descobre ser Cyrano o
objeto de sua adoração.
Mito do amor impossível e de um sentimento cuja sinceridade triunfa sobre
os artificialismos da corte, Cyrano de Bergerac tem pouco em comum com o
Savinien de Cyrano que, nascido em Paris no ano de 1619, adota o sobrenome
Bergerac de uma propriedade outrora pertencente a seu pai. Baseada no
conhecimento erudito de Rostand sobre sua personagem, a peça é um devaneio
que contribuiu para a fama do autor — mas certamente não ajudou a tornar sua
obra mais familiar.
Os dois traços marcantes do Cyrano de Rostand são distorções biográficas
adaptadas ao gosto da época. Assim, todas as personagens da peça guardam
semelhança com algumas figuras que conviveram com o Cyrano “empírico”,
mas a principal delas, Roxane, é uma inversão: existiu de fato uma prima de
Cyrano, chamada Madeleine Robineau e casada com Christian de Neuvillette;
mas, longe de se retirar num convento após a morte do marido, esta se empenhou
em converter seu libertino parente, pelo qual, ao que se sabe, não nutriu
sentimentos apaixonados...
Da mesma forma, o conspícuo nariz não parece ter dado origem a um
complexo de feiúra, como sugere Rostand, mas a uma voluntariosa e satírica
defesa de suas virtudes morais, como nessa passagem de Viagem à Lua em que
ele conta como a falta de nariz constitui, entre os selenitas, motivo de grande
preocupação: “Um nariz é à nossa porta uma bandeira que diz: Aqui mora um
homem inteligente, prudente, cortês, afável, generoso e liberal (...) um [nariz]
pequeno é a rolha dos vícios opostos. É por esta razão que dos achatados fazem-
se os eunucos, porque a República prefere não ter filhos deles a tê-los
semelhantes a eles”.
Evidentemente, pode-se objetar que essa fantasiosa apologia dos narigudos
revela sentimentos arraigados de inferioridade e as obsessões de um narcisismo
contrafeito — mas aí estaríamos no âmbito das especulações psicanalíticas.
Naquilo que tange a letra de Cyrano, esse nariz — bem como tudo o mais que há
na peça — nos introduz numa obra marcada pelo elemento cômico.
Tal comicidade, contudo, não abrange toda sua produção e corresponde a
códigos literários da época, à convivência entre réalistes (com uma literatura de
feição satírica), précieux (poetas de estilo galante, amaneirado) e os adeptos de
um classicisme à maneira dos antigos. Cyrano não corresponde a estes últimos;
segundo Van Tieghem, ele é “ao mesmo tempo um précieux e um realista
burlesco”, além de autor de uma tragédia intitulada A morte de Agripina, cujo
ateísmo o identifica aos libertinos, a um livre pensamento e a um
anticlericalismo de que dão provas suas zombeteiras cartas (como as que estão
publicadas ao final do presente volume). Aqui, já estamos bem distantes do
Cyrano de Rostand, do simpático e lírico farsante que desperta sentimentos
autênticos na “preciosa” Roxane — pois nosso Savinien é bem mais complexo e
mescla, em sua vida e em sua obra, um pouco de cada coisa, expressando
também as contradições de sua época e de sua classe.
Uma das tentações biográficas seria ver paralelismos entre as trajetórias de
Cyrano e de seu contemporâneo La Rochefoucauld. O célebre moralista deu
início a sua carreira como autor de máximas e sentenças morais após se ver no
Description:A publicacao de Viagem a Lua, de Cyrano de Bergerac, repoe em circulacao, em traducao nova e integral, um texto polemico para o conhecimento de sua obra, sua epoca e da historia da literatura. Ao mesmo tempo, o volume vem acompanhado de diversas cartas do autor, ineditas no Brasil, que se relacionam