Table Of ContentCELSO FURTADO
Obra autobiográfica
Edição definitiva
Sumário
Apresentação da primeira edição — Francisco Iglésias
A FANTASIA ORGANIZADA
Prefácio
Os ares do mundo
1.
Fuga para a planície
2.
O Manifesto dos periféricos
3.
A descoberta do Brasil
4.
A dinâmica do sistema centro-periferia
5.
A estrada real
6.
O grande heresiarca
7.
Golias e Davi
8.
A alegria límpida de criar
9.
Sarça ardente
10.
Confrontação em campo aberto
11.
Cavaleiro andante
12.
As contas do passado
13.
A ceia de Natal
14.
A FANTASIA DESFEITA
Prefácio
.O Nordeste: alicerces do subdesenvolvimento
1
.O quadro internacional: projeções no Brasil
2
.A Operação Nordeste
3
Prolegômenos
A reunião do Palácio Rio Negro
Os primeiros aliados
O novo papel dos governadores
A nova política de desenvolvimento para o Nordeste
.O Conselho de Desenvolvimento do Nordeste
4
Os programas prioritários
A reunião dos bispos em Natal
A lei de irrigação
As armas dos adversários
A ofensiva do FMI
Ação preventiva contra a seca
A lei instituindo a Sudene
.A Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste
5
O I Plano Diretor
A catástrofe de Orós
A escassez de técnicos
A Sudene e a sucessão presidencial
A experiência de Israel
Interpretando Sartre
Autossucessão na Sudene
Novo estilo de governo
A Aliança para o Progresso
A fronteira maranhense, 304
Visita ao presidente Kennedy
Encontro com Che Guevara
Começo dos incentivos
A renúncia do presidente
Aprovação do I Plano Diretor para o Desenvolvimento do Nordeste
A síndrome de Cuba entre os norte-americanos
Um novo quadro social
O II Plano Diretor para o Desenvolvimento do Nordeste
Projeto de “manifesto” das forças progressistas
.O Plano Trienal
6
Uma nova missão
Conferência frustrada da OEA
Inovações no planejamento
O insucesso de San Tiago Dantas
Farewell a Prebisch
.O último mandato
7
A Sudene a pleno vapor
O declínio da autoridade do presidente
Alucinações
Ajuste de contas
Testamento intelectual
A deposição do governador Arraes
A retirada
OS ARES DO MUNDO
Prefácio
1.A retirada
Que rumo tomar?
Jorge Ahumada
Nova leitura dos textos da Cepal
Da dependência tecnológica à cultural
Uma sociedade inviável?
Os vagares do intelectual
Entre pessimismo e idealismo
Uma interpretação do Brasil
O novo contexto
2.INTERREGNO NORTE-AMERICANO
O molde de uma nova civilização
A dicotomia eleitos-excluídos
Salvaguardas contra o “democratismo”
A era do protecionismo
Entre mitos e realidades econômicas
O fastígio do poder norte-americano
Projeções da Guerra Fria no Terceiro Mundo
O homem do mundo pós-industrial
Woodbridge
O Centro de Estudos do Crescimento Econômico
Explicando o subdesenvolvimento
As primeiras rachaduras
3.OS ANOS DE PEREGRINAÇÃO
De Gaulle e o novo policentrismo
A problemática do subdesenvolvimento
A arma das ideias e seus adversários
A revolução branca
O “modelo” brasileiro
Quem justifica a concentração da renda?
Realidade e mito do desenvolvimento econômico
O presidente Juan Perón
A hora e a vez do Chile
Para onde vai a América Latina?
O México se volta para o sul
A Venezuela no boom do petróleo
Notas sobre a economia venezuelana
Portugal na hora das opções decisivas
A economia portuguesa: tendências estruturais e perspectivas
Uma nova ordem econômica internacional
Em busca da solidariedade na sociedade global
4.DO UTOPISMO À ENGENHARIA SOCIAL
A herança ideológica
A reversão do horizonte utópico
A sociedade acumulativa e a razão na História
Os conflitos sociais como motor da História
O voluntarismo como acelerador da História
Emergência do modo de produção soviético
Experiências de engenharia social
A convulsão agrária da Etiópia
O caleidoscópio cubano
O caso singular da Mongólia
As revoltas recorrentes da China
Revisitando a China
Teses subjacentes às ideologias revolucionárias
Apresentação da primeira edição
Francisco Iglésias
Como relembra em “Aventuras de um economista”, texto seu publicado pela
Unesco em 1973, a primeira paixão intelectual de Celso Furtado foi a História,
desde a idade de catorze anos. A segunda foi a literatura, lida ainda menino e com
atenção permanente. Leu muito de autores positivistas, ainda em moda em sua
juventude. Está aí a primeira linha de influência. A segunda será Marx, “subproduto
de meu interesse pela História”. A terceira é a sociologia norte-americana, com a
“teoria antropológica da cultura”, revelada por Gilberto Freyre em Casa-grande e
senzala, que lhe deu instrumental de trabalho, embora pouco o marcasse “no que
respeita a sua mensagem substantiva”. O autodiagnóstico é perfeito, pois seus
leitores percebem que pouco ou nada o marcou. A obra de Freyre, de influência
avassaladora nas primeiras décadas de seu aparecimento, não deixou sinais na
trajetória desse estudioso do processo social.
Celso Furtado adquiriu notoriedade nacional como homem público e
economista. Paraibano de Pombal, jovem ainda saiu de sua pequena cidade e foi
estudar na capital do estado, e, pouco depois, em Recife. Em seguida, foi para o Rio
de Janeiro, em 1939, onde cursou a faculdade de direito da chamada Universidade
do Brasil, na qual se diplomou em 1944. Desde 1940 é jornalista na Revista da
Semana. Em 1943 é aprovado em concurso do Dasp e começa a carreira de
funcionário público, na qual se mantém, nunca tendo se vinculado a empresas
privadas. Dominado por preocupações com problemas de administração, detém-se
em questões de organização, cujas teorias estuda, dando vigor à sua atividade no
setor público.
Logo após ter se formado em direito, Celso Furtado seguiu para a Europa como
soldado da Força Expedicionária Brasileira. Pouco atuou no campo de batalha, pois
a guerra estava no fim. Foi para a Itália em janeiro de 1945, a guerra terminou em
setembro, e já antes, em agosto, retorna ao Brasil. Essa terá sido a sua primeira
grande viagem. Muito da experiência de então está retratado em seu livro de
estreia, Contos da vida expedicionária — De Nápoles a Paris, de 1946. Começa, pois,
por uma obra de ficção, que pouco marcará a sua trajetória de escritor nos
primeiros anos. Não se detém no Brasil, logo segue de novo para a Europa, em
dezembro de 1946, agora para fazer um doutorado em economia na Universidade
de Paris, concluído em junho de 1948.
Celso Furtado optou pelo direito numa época em que esse curso ainda tinha
sólida tradição no país, pois foi o primeiro de nível superior, nas faculdades de São
Paulo e Recife, criadas já em 1827. A do Recife foi famosa e formou muita gente
desde a sua criação, dando ao país alguns de seus mais notáveis quadros intelectuais
e políticos. Tal como a de São Paulo, criou um centro muito vivo, do qual saiu o
mais dinâmico núcleo de parlamentares e homens de governo, bem como os
principais nomes da literatura e do pensamento de larga atuação e influência na
política — no Executivo e no Legislativo — e na vida intelectual. O romantismo e o
naturalismo, o direito e as primeiras manifestações de pensamento na ainda incerta
ciência social saem sobretudo de suas salas de aula. Recife e São Paulo foram os
grandes núcleos formadores de onde se irradiou o mais expressivo da vida pública e
intelectual do Brasil oitocentista.
Havia muito de convencional e formalismo nesse curso, pela visão limitada de
então, quando tem começo a influência das ciências sociais, ainda incipientes
mesmo na Europa. E a situação perdura no começo do século atual, quando a velha
estrutura conhece maior empenho na absorção do novo, pregado pela sociologia,
pela economia e por outras ciências sociais.
O grande marco de mudança, superação da ordem arcaica, é a década de 1920,
com o movimento modernista na literatura, nas artes plásticas e na música, que
confirma a imposição renovadora. Sem falar que se acentua a agitação política, com
o surgimento do tenentismo a marcar então os rumos do país nas décadas
seguintes. No plano do pensamento, as correntes vindas do século anterior, como o
positivismo, são consolidadas, e assiste-se à abertura para formas de pouco cultivo
até então, como a sociologia, a economia e outras. Contam a abertura para o
estudo e a relativa absorção do mundo norte-americano. Sem negar o tradicional
eurocentrismo da vida universitária — quase reduzida aos cursos de direito,
medicina e engenharia —, a atividade intelectual é enriquecida com o estudo
sistemático da economia, da sociologia, enquanto antes havia certo monopólio do
direito.
A partir de 1930, verifica-se profundo movimento político que ficará conhecido
como Revolução de 30. Não foi uma revolução, mas uma importante tentativa para
superar a ordem arcaica, bem caracterizada como colonial. É nesse quadro que,
além da renovação artística, assiste-se também à revisão de formas cristalizadas de
pensamento, com uma nova sociologia e outras ciências sociais, como a
antropologia e a economia, até aí de limitado cultivo e dentro de padrões já
superados nos centros criativos da Europa e dos Estados Unidos. O surto inovador
decorre da existência da universidade; aí se ensinavam essas matérias, embora de
modo formal e nada instigante, em escala reduzida e presa a rígidos padrões, como
se vê pela repercussão do positivismo ou do marxismo, cultivados mais como
ideologia que como ciência. Veja-se o caso da economia, objeto de estudos
superiores nas escolas de direito ou nas politécnicas, que a ensinavam com o forte
acento jurídico e equívoco uso da matemática. Os dois desvios comprometiam o
trabalho e davam produtos convencionais e de mínimo alcance científico.
Após a vitória das críticas feitas durante os anos 1920 e 1930, desvenda-se a
limitação de muito do produzido. Intensifica-se o intercâmbio com o exterior: mais
estudantes vão fazer cursos ou aprimorar conhecimentos fora. Aumenta o número
de professores estrangeiros nas escolas nativas. Houve a experiência da
Universidade do Distrito Federal e, mais ainda, a criação da Universidade de São
Paulo, em 1934. Florescem então sobretudo os cursos de ciências sociais e, entre
eles, o de economia. As faculdades de filosofia e de ciências econômicas
multiplicam-se e o padrão geral do ensino é elevado, com a superação de velhas
fórmulas.
Forçando um pouco, pode-se dizer que a ciência social surge nos anos 1930, pois
é muito superior a visão da sociedade que se tem a contar dessa década. O gosto
pela teoria é revigorado e a prática da pesquisa, até então pouco cultivada, vai
impor-se. A renovação se verifica em todos os campos, mas é mais sensível e eficaz
na economia e na história, que reveem seus modelos e inauguram uma época
altamente criativa e fecunda. Como símbolo do sentido inovador, com resultados
imediatos, veja-se o caso da economia. O aprofundamento de seu estudo leva à
superação das formas vigentes, impondo-se um ensino teórico e prático até aí quase
desconhecido. Importante também é que se volta para a pesquisa, na busca do
conhecimento do país real.
Além dos esforços das escolas — públicas ou particulares —, passa a contar o
quanto é feito pelo governo, nas esferas federal, estaduais e municipais. Como a
administração perde o ranço burocrático e tende à funcionalidade, ministérios e
outras repartições federais, bem como secretarias e outros serviços nos planos
estaduais e municipais, são reexaminados e reveem os seus programas. Se a década
de 1930 conhece êxitos notáveis, esses são devidos sobretudo à ação renovadora
pós-30, notadamente no Estado Novo.
Demais, o país vê crescer sua população, assiste ao surgimento de uma nova
sociedade, mais industrial que agrária — era preciso esquecer o lema do país
“essencialmente agrícola” e atentar não só para as atividades extrativas ou agrárias,
como também para a indústria. Há também uma nova compreensão da
administração, que passa de patrimonial a burocrática — usando as categorias de
análise weberiana. Em síntese, surge uma sociedade diversificada em que contam
tanto a agricultura e a extração como a indústria e, em sentido superior, a
organização do Estado, ou, para usar fórmula comum na época, elaborada por
Colin Clark, os setores primário, secundário e terciário. Impõem-se aqui modelos
produtivos e administrativos que se desenvolvem nos países de economia avançada
e de sociedade com fundamento na racionalidade administrativa. Este deve ser o
sentido do país pós-Revolução de 30, o que é compreendido e em grande parte
realizado. O Brasil moderno tem aí sua matriz.
Celso Furtado é a melhor expressão do novo tempo, como administrador e
cientista social. Com obra já dilatada — que alcançaria mais de trinta títulos —,
exerce ampla influência não só entre nós, como na América Latina, com
ressonância nos Estados Unidos e na Europa. Esta não se restringe aos círculos
acadêmicos, mas é verificável em todo o universo da ciência social. Seus livros são
traduzidos em todos os continentes e alcançam várias edições (não só para línguas
mais comuns, mas também para o chinês e japonês, polonês e até para o farsi),
despertando críticas, estudos, análises. O autor, se tem bibliografia ampla, também
tem ampla bibliografia sobre ele.
Visto inicialmente como economista, tem uma obra de importantes
desdobramentos e que hoje deve ser percebida como a de um pensador que trata
do social e sua amplitude, e se detém em reflexões sobre a arte, como se comprova
em Criatividade e dependência na civilização industrial, de 1978. Mais ainda: vem
escrevendo suas memórias, que fogem do modelo tradicional do gênero, sendo
antes memórias intelectuais, ou o processo de formação de alguém que atuou e
atua como cidadão consciente e inventivo em sua terra e em importantes
organismos internacionais, que ficam marcados pela sua presença ou simples
passagem. Esses escritos de natureza autobiográfica constituem agora nosso objeto
de estudo, uma vez que se reúnem aqui seus livros de natureza confessional:*
Contos da vida expedicionária, de 1946, A fantasia organizada, de 1985, A fantasia
desfeita, de 1989, e Os ares do mundo, de 1991, além de textos mais recentes e ainda
não devidamente editados ou conhecidos.
Celso Furtado editou mais de trinta livros de abordagem de temas econômicos e
Description:A “Obra AutobiogrГЎfica” de Celso Furtado Г© formada por uma trilogia, agora em nova ediГ§ГЈo revista e anotada. Em A fantasia organizada, ele relembra o Rio de Janeiro dos anos 1940 e seu ambiente intelectual que deslumbrou o jovem recГ©m-chegado da ParaГba; a devastada Europ