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RADEK CHLUP
PROCLO
UMA INTRODUÇÃO
(Traduzido e Revisado por: Ruan Carlos)
(Ajudante: Edgar Santos)
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Sumário
Notas ................................................................................................................................................ 6
Introdução ........................................................................................................................................ 8
I – Contexto Histórico ..................................................................................................................... 16
I.I – O Neoplatonismo e a Tradição Neoplatônica ........................................................................ 16
I.2 – Plotino contra o Neoplatonismo Tardio ............................................................................... 24
I.2.I – Inclinação para sutis classificações ................................................................................. 26
I.2.2 – Os limites impenetráveis entre os níveis da realidade ................................................... 30
I.2.3 - Retorno para a Religião ................................................................................................. 39
I.3 – Proclo e o Neoplatonismo Ateniano..................................................................................... 42
I.3.I – De Jâmblico para Proclo ................................................................................................. 43
I.3.2 – Escritos de Proclo.......................................................................................................... 48
I.3.3 – Os últimos dias do Neoplatonismo ................................................................................ 56
2 - Metafísica de Proclo .................................................................................................................. 59
2.I - O Um e o Bem como o começo e o fim de todas as coisas .................................................... 61
2.I.I - A presença positiva do Um e do Bem em todas as coisas ................................................ 63
2.I.2 - Teologia Negativa .......................................................................................................... 68
2.2 - O ciclo de Processão e Reversão .......................................................................................... 77
2.2.I - Por que o Um cria níveis inferiores? ............................................................................... 77
2.2.2 - Processão e Reversão ................................................................................................... 80
2.2.3 - Níveis auto-constituídos ............................................................................................... 86
2.2.4 – O Limite e o Ilimitado ................................................................................................... 94
2.3 – Graus da Realidade ........................................................................................................... 101
2.3.I –Todas as coisas estão em todas as coisas ..................................................................... 101
2.3.2 – Ser – Vida – Intelecto ................................................................................................. 113
2.4 – Níveis de Participação ....................................................................................................... 120
2.4.I – Participando – Participado – Não-Participado ............................................................. 120
2.4.2 – Participação e a Relação entre os Níveis da Realidade ................................................ 123
2.4.3 – Graus de Participação ................................................................................................ 128
3 – Teologia Politeísta de Proclo................................................................................................... 135
3.I – Hênadas ............................................................................................................................ 136
3.2 – Deuses inferiores e a hierarquia de hênadas ..................................................................... 143
3.3 – Correntes Verticais ........................................................................................................... 152
4 – Epistemologia ......................................................................................................................... 161
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4.I – A Alma como uma imagem discursiva do Intelecto ............................................................ 162
4.2 – Projeção e Recolha ........................................................................................................... 170
4.3 – Opinião como projeção não-refletida................................................................................ 175
4.4 – Matemática e dialética ..................................................................................................... 179
4.5 – Além da discursividade ..................................................................................................... 187
5 – Meios de Unificação ............................................................................................................... 192
5.I – O um na Alma .................................................................................................................... 193
5.2 – Teurgia ............................................................................................................................. 199
5.2.I – Teurgia Externa ........................................................................................................... 200
5.2.2 – Níveis de Teurgia Interna ........................................................................................... 205
6 – Poesia inspirada e seus símbolos ............................................................................................ 217
6.I – Em defesa da obscenidade mítica ...................................................................................... 218
6.2 – Filosofia como exegese simbólica ..................................................................................... 227
7 – Mal e teodicéia ....................................................................................................................... 235
7.I – Crítica de Proclo à Plotino .................................................................................................. 237
7.2 – Mal como desvio de uma natureza ................................................................................... 243
7.3 – Mal como distorção da hierarquia vertical ........................................................................ 246
7.4 – Mal nas almas e nos corpos .............................................................................................. 249
7.5 – O mal como perversão do Bem ......................................................................................... 255
7.6 – Porque o mal existe? ........................................................................................................ 257
7.7 – Mal e providência: Teodiceia de Proclo ............................................................................. 262
8 – Ética ........................................................................................................................................ 273
8.I – Virtudes da sabedoria neoplatônica ................................................................................... 275
8.2 – Ação e contemplação ....................................................................................................... 287
9 – Cosmovisão............................................................................................................................. 295
9.I – Filosofia e religião na antiguidade tardia ............................................................................ 297
9.2 – A virada interior: Plotino e os ‘Amigos de Deus’ ................................................................ 307
9.3 – Re-externalização jamblicana ........................................................................................... 317
10 – Epílogo: Legado de Proclo ..................................................................................................... 323
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Figuras
Figura 1: Dois ciclos de processão e reversão página 87
Figura 2: Processão e reversão de hipóstases auto-constituídas 89
Figura 3: Múltiplas camadas de processão e reversão 102
Figura 4: Camadas da alma 103
Figura 5: Graus de causalidade 104
Figura 6: Mundo material espelhando os níveis superiores 108
Figura 7: O Um e a matéria como causalmente interconectados 108
Figura 8: A estrutura do Intelecto geral 116
Figura 9: O Intelecto geral em sua auto-reversão 116
Figura 10: Mundo material espelhando os níveis superiores 118
Figura 11: Hierarquia da participação 124
Figura 12: Participação do corpo humano na alma 132
Figura 13: Hierarquia das hênadas 145
Figura 14: Participação nas hênadas 147
Figura 15: Alma e seus dois ciclos de processão e reversão 167
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Notas
Quero dizer, antes de tudo, que toda essa tradução de um dos melhores
livros introdutórios acerca da filosofia neoplatônica tardia, com ênfase na que
foi desenvolvida por Proclo Lício, foi feita de forma totalmente voluntária e
amadora – ‘amadora’ no sentido de expor que foi feita sem fins lucrativos e
que traduções não são uma fonte de renda para mim.
Por conta disso, e também por ter sido a primeira tradução de minha
autoria, talvez haja alguns erros mínimos quanto a vírgulas ou concordância,
mas, se for o caso, asseguro que serão realmente mínimos e detalhistas, não
afetando no entendimento do texto.
Dito isso, posso começar a esclarecer algumas coisas que serão tratadas
no livro, apesar de serem evidentes pelo sumário. O capítulo introdutório do
livro nada mais é do que algumas considerações feitas pelo autor, Radek
Chlup, e algumas explicações da maneira com que ele escreveu e seguiu o
curso do livro. Posteriormente, temos um capítulo que aborda a história do
neoplatonismo, tanto o neoplatonismo “clássico”, por assim dizer, quanto o
tardio. Nesse capítulo, do contexto histórico, o autor também explica alguns
conceitos básicos da filosofia neoplatônica, conceitos esses que estão
presentes de maneira comum em ambas as escolas (“clássica” e tardia) e
serão usadas de forma frequente no decorrer do livro.
A partir desses 2 capítulos é que, então, o autor começa expor a filosofia
de Proclo propriamente dita, começando tratando de sua metafísica – que é,
por sinal, muito complexa – e, após ela, suas consequências, isto é, as
conclusões que podem ser retiradas a partir dela: uma teologia politeísta,
métodos epistemológicos, conceitos de teurgia, etc.
O livro também aborda a questão do “Problema do Mal”, presente em
quase todos os tipos de teologias, e compara os pensamentos de Proclo (e
dos neoplatonistas tardios) com os pensamentos de Plotino.
O livro se encerra, portanto, falando acerca da visão de mundo desses
neoplatonistas e, posteriormente, o legado dos mesmos – principalmente,
claro, o de Proclo.
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O livro original pode ser encontrado em pdf no site “libgen”.
Link para download: Radek Chlup - Proclus: An Introduction1.
Caso seja de interesse, possuo um blog sobre misticismo e afins: Pulvis
Solaris.
1 Livro traduzido e revisado por Ruan Carlos;
Auxiliar de tradução: Edgar Santos.
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Introdução
O Neoplatonismo tardio é um dos mais complexos sistemas metafísicos
já produzidos no Ocidente. Apesar disso, de todas as áreas do pensamento
antigo, provavelmente é a menos familiar. Ao passo que seu fundador, Plotino,
já ganhou uma certa notoriedade entre os clássicos da filosofia, com seus
tratados sendo estudados, até mesmo por aqueles não especializados no
pensamento antigo; os neoplatonistas tardios ainda são conhecidos,
somente, por um punhado de especialistas, e, no geral, seu reconhecimento
filosófico é mínimo. Em nenhum lugar isso é tão óbvio como em Proclo de Lícia
(412 – 485 d.c). Embora não fosse um pensador de todo original, Proclo
produziu a versão mais metódica da filosofia neoplatônica tardia, e sua
posição dentro da tradição neoplatônica, talvez deva ser comparada à de
Tomás de Aquino na escolástica. Seu impacto no pensamento póstumo foi
considerável: Tendo influenciado tanto o pensamento Bizantino como a
Escolástica Ocidental, ademais, foi minuciosamente estudado no
Renascimento, e deixou vestígios profundos no Idealismo Alemão. Em
relação a quantia literária preservada, ele se encontra no top cinco dos
filósofos antigos. Embora poucos desses ainda sejam estudados atualmente.
As razões para tal negligência jaz na enorme complexidade do sistema
de Proclo, tal como sua predileção por terminologia técnica, o que torna a
leitura de seus tratados extremamente difícil aos neófitos. A maioria das obras
que possuímos são compostas por estudantes já adaptados a filosofia tardia
do neoplatonismo, e são de difícil compreensão sem algum conhecimento
prévio. Nesse sentido, Proclo é extremamente deficiente, se comparado a
Plotino, ao qual muitos tratados são de fácil leitura aos iniciantes, pois esse
revisa seus conceitos constante e repetidamente do zero, fornecendo ao
leitor oportunidades suficientes para, por assim dizer, seguir a viagem
metafísica. Com Proclo, pelo contrário, deve-se primeiro dominar os
elementos básicos do sistema para entender, até mesmo, uma única página
de texto. É esse requisito que produz uma barreira que apenas um pequeno
número de estudantes consegue romper. Consequentemente, os estudantes
de Proclo atuais compõem um círculo parcialmente fechado. O público
filosófico geral é deixado de fora, não tendo qualquer acesso facilitado ao
pensamento de Proclo.
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Obviamente, o que supre tais circunstâncias é um livro introdutório
explicando articuladamente os princípios básicos de tal filosofia, tornando seu
intrincado sistema algo acessível a novatos. Somente por essa via, o estudo
de Proclo deixará de ser uma iniciativa esotérica, e passará a ser uma
propriedade pública. Infelizmente, as pesquisas existentes acerca de Proclo,
são bastante insatisfatórias quanto a isso. Os estudos de Rosán (1949) e
Siorvanes (1996) no inglês, são muito característicos e falham em fornecer
uma compreensão adequada da filosofia de Proclo. Embora a situação
também não esteja melhor noutros idiomas. A melhor via de iniciação nos
mistérios do neoplatonismo procleano, até então, tem sido a leitura do
Elements of Theology, com excelentes comentários de E. R. Dodds.
Infelizmente, tal via não será trilhada por muitos, uma vez que exige não
somente paciência, mas, sobretudo, um conhecimento sólido do grego antigo
– pois na época de publicação do livro (1933), tal conhecimento já era
pressuposto, assim, pensava-se não ser necessário traduzir as citações dos
filosófos gregos ao inglês.
O objeto do presente livro é remediar o estado atual e fornecer um
acesso mais simples ao campo do neoplatonismo tardio. Tenho como objetivo
introduzir Proclo àqueles, no geral, interessados em filosofia, mas sem
conhecimento prévio de neoplatonismo, ou até mesmo de filosofia antiga, no
que vai além do básico. Tomei cuidado especial para não fazer um simples
resumo das ideias de Proclo, mas para trazê-las a vida e mostrá-las como
respostas relevantes à questões filosóficas. Embora muitos conceitos de
Proclo possam parecer bizarros atualmente, ainda almejo apresentá-los como
uma possibilidade significativa da observação do universo e para encontrar a
via individual em relação a este. Até onde eu cumpri esse propósito, cabe ao
leitor criterioso julgar.
Minha análise do pensamento de Proclo segue, no geral, uma norma
padrão para o gênero de história da filosofia; em alguns aspectos, contudo,
ultrapasso os limites de tal gênero. Mas somente no capítulo 9 o faço
abertamente, embora até mesmo os capítulos anteriores sejam
implicitamente modelados por certas pressuposições metodológicas, das
quais estudantes de filosofia antiga podem não se lembrar, e os quais irão,
portanto, ter a utilidade de resumir de forma breve e explicar desde seu início.
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A meu ver, a história da filosofia serve como um exemplo preciso dum
esforço humano geral para tornar a experiência de vida numa base
significativa que orienta o mundo. Refiro-me a tais bases como
“cosmovisões”. No caso dos neoplatonistas, a sua cosmovisão é expressa em
um sistema metafísico, apesar de não igualar-se a esse. Cada sistema filosófico
apoia-se em uma porção de pressuposições e preferências que distanciam-se
do óbvio e não possuem justificativa lógica, sendo, portanto, uma questão de
escolha e fé para o indivíduo ou coletivo. Um bom exemplo é a consideração
de Plotino quanto a alma humana ligar-se ao intelecto, contrastada pela
rejeição de Proclo de tal ideia e sua insistência na inabilidade da alma de deixar
sua posição (veja abaixo, cap. 1.2.2). Ambos apresentam diversos argumentos
filosóficos acerca de suas convicções antagonistas, apesar de serem, em
última análise, racionalmente inexplicáveis, subordinados às preferências de
cada filósofo. Eu compreendo uma “cosmovisão” como sendo um conjunto
holístico de todas essas preferências e pressuposições básicas que o filósofo
escolheu, simplesmente, considerar como válidas. Sistemas metafísicos são
conceituações lógicas de cosmovisões, e, portanto, são subordinados às
preferências vinculadas a tais. Nesse sentido, eles ocultam a cosmovisão atrás
dessas na mesma proporção em que a revelam – pois na maioria dos casos,
eles levam a atenção a própria natureza condicional.
O conceito de “cosmovisão” auxilia-nos a apresentar um importante
fato, o de que até mesmo sistemas metafísicos similares podem conduzir a
formas diferentes de orientar-se no mundo. Proclo concorda com Plotino na
vasta maioria de seus conceitos metafísicos, e, à primeira vista, pode parecer
que as diferenças entre eles são mínimas. Contudo, uma vez que cessemos de
seguir doutrinas específicas, e passemos o foco às cosmovisões gerais que os
fundamentam, o universo de Proclo parecerá bem diferente daquele de
Plotino. A causa para tal é a natureza fundamentalmente holística das
cosmovisões. Uma cosmovisão funciona como um enigma linguístico de
Wittgenstein: ela não resume seus elementos particulares, mas todo o sistema
que rege suas relações. Portanto, o mesmo conjunto de cartas pode ser
utilizado em jogos diversos. Isso é, simplesmente, o que se percebe entre
Plotino e Proclo: Os seus princípios e conceitos básicos são similares, mas cada
filósofo utiliza-os em jogos linguísticos variados. O que para um é natural, ao
outro é inaceitável. Em minhas análises, tentarei, constantemente, levar em
conta as condições e limitações da cosmovisão holística. Meu objetivo não se
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